Autismo e superdotação: a criança duas vezes excepcional

Eu sempre soube que meu filho era inteligente. Muito inteligente, mais do que as crianças da sua idade. Mesmo antes do diagnóstico Asperger (agora classificado como autismo leve). Ele aprendeu a ler e escrever sozinho aos dois anos de idade, conhece frações, raiz quadrada, operações matemáticas, números romanos, alfabetos em muitas línguas (russo, polonês, grego…) e conversa como se fosse um adulto. Confesso que isso tudo já me confundiu. Como pode uma criança tão inteligente ter demorado tanto para sair da fralda?

Os interesses restritos de uma criança com autismo podem ser confundidos com genialidade. Sabe aquela obsessão por trens, aviões ou dinossauros? Ela pode ser confundida com a superdotação, já que a criança desenvolve um conhecimento muito grande sobre determinado assunto e fala sobre ele com propriedade. Mas é preciso aprender a diferenciar, avaliar a criança ao longo de seu desenvolvimento. Embora incomum, existem crianças que são duas vezes abençoadas, ou seja, são duplamente excepcionais.

O diagnóstico é difícil. Aproximadamente 70% dos casos de autismo possuem algum grau de deficiência intelectual, 20% estão avaliados na média e apenas 10% possui algum tipo de habilidade intelectual (Brentani, et al. 2013).

É importante enxergar que existe um desequilíbrio entre as capacidades intelectuais dessa criança e suas habilidades de relacionamento. A avaliação precisa é muito importante para fornecer o apoio correto a essa criança, visando principalmente essa disparidade entre pontos fortes e pontos fracos. Enxergar e exortar apenas sua alta inteligência é tão prejudicial quanto condená-la e submetê-la a horas de terapia semanal para desenvolver habilidades de socialização.

Aqui vão algumas dicas de como ajudar uma criança com estas condições:

  • Ensine habilidades sociais. A criança com essas características é muito vulnerável ao bullying. Além de ser ingênua, seus interesses e comportamentos são muito diferentes dos demais da sua idade. Ensine-a a ouvir mais do que falar, conviver com outras crianças da sua faixa etária mesmo que prefira ficar com os adultos, brincar de forma variada, entender as “pistas” sociais (se estiver fazendo uma pergunta invasiva ou estiver sendo inconveniente, por exemplo). Além disso, procure crianças que tenham interesses semelhantes, pois pode ser um alívio para ela. (leia mais sobre como estimular as habilidades sociais aqui)
  • Ajude-o a expandir seus interesses. Caso ela possua interesse restrito, procure variá-lo. Incentive-a a buscar ramificar o conhecimento sobre as coisas que lhe interessam. (leia mais sobre o autismo e as fixações aqui)
  • Incentive a prática de algum esporte. Eu sei que eles não costumam ser muito habilidosos para os esportes e, na maioria das vezes, não têm o menor interesse em explorar essa área. Mas procure alguma atividade física que possa lhe proporcionar prazer e, de quebra, contribuir para seu desenvolvimento social. Se esportes coletivos (como futebol ou artes marciais) definitivamente não o agradam, busque alternativas individuais, como a natação.
  • Estimule a imaginação. Jogos de faz de conta ou ficção não são os preferidos das crianças com autismo. As brincadeiras concretas, de lógica ou causa e efeito costumam fazer muito mais sucesso. Mesmo assim, sem forçar, você pode ajudar seu filho a desenvolver esse lado imaginário e criativo, através de historinhas, brincadeiras de faz de conta e da convivência com outras crianças. Sempre, é claro, respeitando a individualidade de seus interesses.

Sem a nossa ajuda, a criança com essa dupla excepcionalidade tende a se isolar. Além das dificuldades sociais comuns no autismo, há também a incompatibilidade de interesses com as outras crianças. Cabe a nós pais e aos outros adultos que convivem com ela a responsabilidade de integrá-la ao mundo e o mundo a ela. Junto ao dom especial está a necessidade especial. Tendo o apoio correto, a criança desenvolverá as habilidades necessárias para conviver com os demais e ser feliz aceitando-se como é!

Por Amanda Puly

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