A geração dos livros que não são de ler

*Por Luana Gabriela

“Jardim Secreto” e “Floresta Encantada” são apenas alguns títulos – os pioneiros? – da moda de livro para colorir destinado ao público adulto. Essa onda seguiu a dos livros interativos para adolescentes e jovens adultos “Listografia”, “Destrua este diário”, entre outros. Até pouco tempo, os livros interativos – com botões, figuras para colorir, recorte aqui, pontilhe ali, eram exclusivamente destinados às crianças, na faixa etária anterior à alfabetização e no início dessa. Isso diz alguma coisa, não?

Não sou favorável a chamar esses livros de interativos, pois pressupõe-se que a leitura então é uma atividade passiva, na qual o leitor apenas recebe e nada interage com o texto que lê. O que, definitivamente, tenho buscado refutar com estudos baseados na Teoria da Recepção. Uma vertente de estudos literários desenvolvida a partir dos anos 70 que aponta o leitor como ativo no processo de leitura. É uma vertente que defende que um texto só o que é a partir do momento em que é lido. Umberto Eco – teórico da área e ficcionista – afirma que o bom livro é aquele que deixa lacunas a serem preenchidas pelo leitor. A falta de lacunas torna a leitura maçante. É por isso que ao longo do tempo os contos de fadas deixam de ser interessantes pressupomos, como leitores experientes do gênero, que o final será feliz, e o texto não nos surpreende: E foram felizes para sempre. Acredito que a febre dos livros – esses já citados e com os quais o que menos se faz é ler – se deve pela falta total de interesse pela leitura genuína. Nada contra eles, tudo a favor dos livros literários. Mas algo está errado. (Inclusive há pessoas questionando o título livros para esses títulos, defendendo que deveriam ser chamados de cadernos de atividades. E quem usa cadernos de atividades? Pessoas em fase de alfabetização ou idade escolar).

Um post no Facebook, hoje já amplamente divulgado diz: Crianças com smartphones e adultos com livro de colorir. A constatação me leva a materializar o que há muito já se percebia: os papeis sociais estão definitivamente em crise. As crianças estão passando por um processo de adultização precoce – o que se dá pelo uso do celular (tenho alunos de 8 anos com Iphones e grupos no Whatsapp), pelas roupas etc. Enquanto isso os adultos passam pela adolescência tardia (infância tardia?) saem cada vez mais tarde da casa dos pais, não assumem compromissos (trabalhar por mais de 5 anos na mesma função? No mesmo lugar? Difícil), enfrentar as dificuldades de um relacionamento por 2, 5, 8 anos? Melhor terminar e começar outro.

Como professora de Literatura e Redação, de crianças e adolescentes, constatei já há muito essa realidade. Não demonizo os livros da moda, apenas defendo a necessidade de buscar mudar essa realidade social – os números divulgados pela Gazeta do Povo sobre a venda desse tipo de livro (http://www.gazetadopovo.com.br/caderno-g/literatura/livros-de-colorir-tiram-lojas-do-vermelho-55ekovuwtrp9r4nxl8p3ha72y) confirmam o fenômeno social. Inclusive, a venda dos livros para colorir tem impulsionado, mesmo que timidamente, a venda dos livros “chatos” aqueles sem figura e sem espaço pra gente escrever, só pra gente pensar e sentir. Duas coisas que estão bem fora de moda no nosso mundo líquido.

Somos todos Romero Brito, mas prefiro o Machado, Leminski, Drummond…

*Luana é jornalista e professora de letras, nos ensinos fundamental e médio.

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